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Abordagem nutricional no paciente com diabetes mellitus

Abordagem nutricional no paciente com diabetes mellitus

23/AGO/2022

Saúde

O Institute of Medicine (IOM) define terapia nutricional como o tratamento de uma doença ou condição mediante alterações dietéticas, seja por nutrientes específicos ou alimentos como um todo (1). Essa terapia se fundamenta no estabelecimento de proporções entre macronutrientes e também na regulação quantitativa e qualitativa desses elementos (equilíbrio energético).

 

A abordagem nutricional no paciente portador de Diabetes Mellitus (DM) é crucial, já que atua de forma profilática, de forma gerencial e também de forma preventiva a possíveis complicações decorrentes da doença. Nesse sentido, as escolhas alimentares agem de modo consequente sobre o peso corporal, percentual de HbA1c, dosagens séricas de lipídios e níveis pressóricos, atuando diretamente no controle metabólico do paciente (1).

 

Apesar dos abundantes estudos relacionados à orientação nutricional do paciente com DM na literatura médica, uma revisão sistemática constatou que a recomendação dietética para esses indivíduos deve seguir padrão semelhante ao definido para a população geral, uma vez que não há proporção ideal aplicável de forma unificada (1). Desse modo, macro e micronutrientes devem ser prescritos de maneira personalizada, considerando as individualidades de cada paciente, tais como idade, necessidade energética, gasto calórico, intolerâncias, preferências, adesão à dieta,  presença de doenças e/ou condições preexistentes, entre outros.

 

Para maiores chances de sucesso na terapia nutricional, tanto o paciente quanto os familiares devem ser envolvidos de forma ativa no processo, respeitando os estágios de mudança do indivíduo (pré contemplação; contemplação; decisão; ação; manutenção; recaída), realizando o acolhimento necessário e fornecendo orientações adequadas a cada estágio. A American Association of Diabetes Educators (AADE) indica a construção de um programa de autogerenciamento da saúde, que se traduz na conscientização do paciente portador de DM acerca da importância do planejamento alimentar, bem como da prática regular de atividades físicas para o controle metabólico, trazendo um aumento no nível de compreensão e maior autonomia ao paciente.

 

Em termos práticos, embora a distribuição geral de macronutrientes na dieta varie entre indivíduos, existem algumas recomendações estabelecidas pela OMS e por sociedades médicas que podem auxiliar e direcionar o manejo nutricional do paciente portador de DM. A ingestão de quantidades inferiores a 130 g/dia de carboidratos é desencorajada pela Organização Mundial de Saúde, dada sua relevância como substrato energético (1). No entanto, já é evidenciado que o tipo de carboidrato consumido é relevante para a variabilidade glicêmica. Nesse sentido, é preferível a ingestão de carboidratos contendo alto teor de fibras, vitaminas, minerais e baixo teor de gorduras, em substituição ao seu consumo na forma de açúcar ou amido. Em relação ao índice glicêmico (IC) e à carga glicêmica (CG), alguns estudos apontaram reduções de 0,2 a 0,5% de HbA1c após introdução de dietas de baixa CG (1). Esse índice se torna mais relevante quando considerada a ingestão de fontes de carboidratos de maneira isolada, em que alimentos de alto IG podem ser substituídos por alimentos de baixo IG visando diminuição da resposta glicêmica. 

 

No que se refere às proteínas, não existem evidências para modificações na recomendação usual de consumo (1 a 1,5 g/kg/dia) para indivíduos portadores de DM que tenham função renal preservada (1). Vale ressaltar que, assim como para a população geral, a prescrição da quantidade de proteína deve ser individualizada e considerar as variáveis metabólicas do paciente.

 

Em relação aos lipídeos, as recomendações mais relevantes em âmbitos nacional e internacional orientam a adoção de padrões saudáveis de consumo, sem especificações quantitativas, mas encorajando a preferência por fontes de gorduras monoinsaturadas (MONO) e poli-insaturados (POLI) em detrimento de ácidos graxos trans e insaturados. A dieta do Mediterrâneo e a dieta DASH, ambas inseridas dentro dos padrões alimentares preconizados na atualidade, trazem como pilares intervenções no consumo de lipídios, sendo a primeira por alterações no padrão de gordura ingerida e a segunda pela redução percentual em seu consumo de forma geral (1).

 

Apesar de não serem contabilizados na ingesta calórica, os micronutrientes (vitaminas e minerais) são indispensáveis para a boa manutenção da homeostase corporal, seja o paciente portador de DM ou não. Não existem evidências científicas que indiquem a suplementação de micronutrientes na DM. No entanto, indivíduos com diabetes comumente apresentam algum tipo de carência  desses elementos, justificadas por perdas excessivas na urina, diminuição da capacidade de absorção intestinal e/ou baixa ingestão dietética (1). Nesse sentido, dosagens periódicas de micronutrientes para acompanhamento são de grande valia nesses pacientes, principalmente das vitaminas B1 e B9, já que o uso prolongado de alguns antidiabéticos podem causar suas deficiências; vitamina B12, por sua estreita relação com o desenvolvimento de neuropatia diabética, mau controle glicêmico e complicações microvasculares; e vitamina D, já que bons níveis de calciferol estão relacionados a uma maior sensibilidade à insulina e  à redução de estados inflamatórios (1).

 

As recomendações para consumo de bebidas alcoólicas na DM não diferem daquelas feitas para a população geral. Apesar disso, vale ressaltar que o álcool induz resposta glicêmica e pode levar à hipoglicemia reativa nesses pacientes. Além disso, o álcool possui 7kcal por grama, o que torna seu consumo ainda mais alarmante em um contexto de necessidade de perda ou manutenção de peso, como é o caso do paciente portador de diabetes.

 

Em síntese, a recomendação geral para o portador de DM é priorizar o consumo de grandes variedades de hortaliças, leguminosas, cereais, frutas, proteínas animais com baixas concentrações de gordura (carnes magras, peixes, aves) e derivados desnatados e/ou reduzidos em gorduras, e evitar ingerir alimentos ricos em gorduras saturadas, álcool e açúcar. A alimentação deve ser baseada no consumo de alimentos in natura ou minimamente processados, sempre respeitando as preferências de cada paciente e limitadores como poder aquisitivo e/ou condições socioeconômicas de forma geral. Caso haja demanda, a inclusão de alimentos com designação diet ou zero é permitida de forma pontual, uma vez que a inserção desses produtos pode aumentar a adesão dos pacientes à terapia nutricional proposta de forma pouco prejudicial (1).

 

Autores: Comissão de Ensino Médico da Sociedade de Acadêmicos de Medicina de Minas Gerais (SAMMG) - Bruna Palhares Reale Pereira e Mariana Nascimento Muzzi

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. SBD - Sociedade Brasileira de Diabetes. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes: 2019-2020. Clannad [Internet]. 2019 [cited 2022 Maio 26]. Available from: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/5730478/mod_resource/content/0/Diretrizes-SBD-2019-2020.pdf